Custa-me um pouco aceitar que
estou heartless. Antes
estar do que
ser, mas ainda assim, é mau. (Quem me manda sentar a conversar de madrugada?).
Mau porque sempre fui
daydreamer, sempre me entreguei sem medo a um par de braços abertos, e hoje sou uma desconfiada, qual judeu vendedor que não aceita fiado.
Não dou, não confio, não acredito - assim não sofro. Continuo a fazer, a dizer, a viver - mas não sinto: porque assim não sofro.
Gostava de sonhar hoje com uma loja de doces, entrar e encher o saco, sentar-me à porta e devorar tudo, com aquele ar de felicidade inocente - como a miúda do poema
Tabacaria, à qual Pessoa diz 'come chocolates, pequena, come chocolates!'.
Quero ser pequenina e grande, porque ser grande sem ser grande coisa não é lá muito bom. A televisão está na VH1 e está a dar o 'everything I do, I do it for you' e eu espreito pela janela a ver se o Robin Hood me acerta com uma flecha no meio da testa. Tenho de arrumar o quarto.
Os presentes esquecidos na saca, a mochila do festival ainda aos pés da cama, a cama por fazer. Tenho o bloco dos poemas a olhar-me com desdém como quem diz 'sabes há quanto tempo não escreves nada de jeito?'.
Tenho de reaprender a gostar de crescer.
Don't tell me it's not worth fighting for. Tenho de reaprender que é bom esquecermo-nos de como éramos, porque a cada momento nos habituamos à nova pele que nos cerca. Tenho de reaprender que é bom rir-me de como era há anos, meses, semanas. Do que pensava, das crenças que transpirava.
Mutação completa: na minha vida já aconteceu de quase tudo. Um auto-romance seria um sucesso, mas não literário.
You know it's true.. Everything I do... I do it for you.Acho que vou dormir. Daqui a pouco, vá.
Apetecia-me andar à chuva. Porque é que não fui de all stars hoje, porquê? Estavam a regar os jardins do Norte Shopping. Desculpa :)