quarta-feira, 10 de março de 2010

onze meses

Menti-te.
Quando enrolei as minhas pernas à volta das tuas, menti-te.
Não fiz juras infundadas, mas um bom mentiroso nunca tem sequer de falar. Prendi as minhas pernas às tuas, puxei-te num abraço, e quando dei por mim, entre suspiros, já eramos um do outro e havia um futuro prometido.
Nunca fui boa a fazer contas de cabeça, mas um futuro é de certeza muito tempo. Menti-te.
Só queria um presente, um instante repetido, um momento congelado que pudesse reviver incessantemente de formas variáveis.
Quiseste abraçar-me para sempre e eu não deixei.
Uma noite, quieto, vieste sorrateiro dizer-me ao ouvido que me querias guardar no bolso. Sempre me assustei com pessoas que guardam coisas nos bolsos, como aqueles homens de casacos pesados, com a vida atracada. Eu. Nos bolsos. Nos teus bolsos. Atracada. Sempre achei que os bolsos só serviam para aquecer as mãos... ou guardar coisas por breves momentos, nunca com o seu quê de eternidade.
Quiseste dar-me a conhecer a eternidade e eu não quis; não estava preparada para um final feliz, porque nunca tinha tido um início.
Só queria deitar-me contigo numa passadeira, a sentir o cheiro da cidade e a pulsar com o barulho da autoestrada. Devia ter percebido logo que não eras homem de autoestradas. Querias-me para sempre e eu menti-te.
Trocaste-me o nome, uma noite. Bem sei que foram breves segundos de engano, e que a meia hora seguinte foi passada a ouvir pedidos de desculpa e lamentos teus, mas segundos de engano são suficientes para uma vida de certezas. Trocaste-me o nome, mas foste sincero; ao contrário de mim, víbora, crápula. Nunca conheci mulher tão vítima e culpada como eu. Menti-te.
Nessa noite virei costas e adormeci sem entrançar as minhas pernas nas tuas. Eram só mais umas pernas, era só mais uma cama... Ficamos momentos em silêncio depois de me teres chamado o nome da outra vagabunda que te partiu o coração, e pensei se isso não seria um prenuncio de que eu também to partiria. Tinhas-te enganado por questões de logistica, mas para mim era o fim do mundo, do nosso.
Quiseste abraçar-me para sempre, mas aquela noite foi a última.
Na manhã seguinte deixaste-me na faculdade, foste trabalhar. Menti-te uma última vez quando disse que ia tentar. Não tentei sequer tentar.
Risquei-te da minha vida como os senhores dos cafés fazem aos gelados esgotados nos cartazes, e não hesitei em rotular-me novamente como solteira.
Foda-se, é tão mais fácil ser infeliz.

1 comentário:

Joana disse...

'Só queria um presente, um instante repetido, um momento congelado que pudesse reviver incessantemente de formas variáveis.'


mas les pensamentos? :o